Diante dos avanços tecnológicos, como por exemplo os meios de comunicação, essa relação tem se tornado cada vez mais prejudicada, pois a praticidade e versatilidade desses veículos de massa proporcionam um menor número de leitores; consequentemente a leitura perde seu espaço nesse meio e SILVA (1988) toca num ponto crucial, que é a necessidade de se criar uma sólida tradição científica na área da leitura, procurando superar o descaso na investigação.
A importância de trabalhar nesta investigação é por crer que o hábito de ler exerce uma grande força num contexto social, político, econômico e cultural, uma nova perspectiva de vida e visão de mundo. Corroborando esse entendimento, KLEIMAN (1989), "aborda a leitura de mundo através da atuação do conhecimento prévio, essencial à compreensão, pois é o conhecimento que o leitor tem sobre o assunto, mundo, que lhe permite fazer as inferências necessárias para relacionar partes de um texto num todo coerente."
A realidade está aí para mostrar a problemática existente na sociedade quando PINHEIRO (1988) afirma que o desinteresse pela leitura é um grave problema, pois a falta de informação leva à preguiça mental e conduz a humanidade ao caos social e cultural; infelizmente, nos meios acadêmicos também. Ora, se o contingente universitário apresenta sérios problemas no que diz respeito a leitura, linguagem, etc., sendo ele considerado parte da elite pensante do país, isso nada mais é do que o reflexo de uma organização desestruturada em termos de formação de futuros leitores e incentivadores da leitura. Nesse sentido, considera - se uma agravante quando se trata do bibliotecário. De acordo com BARROS (1986), "O bibliotecário que não lê se castra consciente ou inconscientemente. Não avança e não promove conhecimento. Não se arma para os imprevistos do dia - a - dia, esquecendo -se que a biblioteca e a universidade são palcos de incontáveis dúvidas que sua cultura pode ajudar."
A autora ainda cita que sendo o bibliotecário, um profissional
da informação, por excelência, não pode, ele
próprio, ficar alheio aos fatos e às notícias, o que
se aplica também a todos os universitários. É esta
constante atualização de conhecimento que faz do seu referencial
teórico uma base segura de leitura e também de apoio ao leitor
que está vinculado.
Certamente, nós bibliotecários, definidos como um dos profissionais da informação, temos a responsabiblidade de mediar parte do conhecimento que chega à sociedade. Qual o nosso papel como agentes sociais? Como divulgadores culturais? Como incentivadores da leitura? Como mediadores da leitura entre o homem e o mundo? Será que estamos trabalhando em conjunto com outros profissionais conscientes também de seus papéis? Estamos aptos a formar uma geração de homens e mulheres dispostos a ampliar a sua visão de mundo?
Quando questionamos nossa postura como cidadãos, formadores de opinião, estudantes e pesquisadores que somos, em relação à sociedade e à nossa comunidade, tratamos aqui de discutir uma questão pública. A nosso ver, a leitura é uma questão pública, um direito do cidadão; portanto, um componente de um ato social, uma ação que em princípio, visa ao benefício de todos, nesse caso, vemos que é dever do Estado garantir que todos possam, se quiserem, usufruir da leitura e da escrita, como um benefício comunitário, direcionado para a informação, a comunicação e educação da sociedade.
A leitura também teve o seu lado particular e individual, como nos apresenta MORAIS (1996); em seu livro, nos mostra, que além de pública, a leitura também se constitui em um deleite individual. É um bem adquirido pela sociedade, mas não exclui as condições do prazer particular, valorizado pela intimidade silenciosa que a leitura pode proporcionar.
A leitura, tomada como problema social se relacionada com "maus" leitores,
raramente é vista como leitura de prazer. Aí, evidentemente,
algumas perguntas surgem: é preciso ler? Por que? Para que? Muitas
respostas existem, como por exemplo: - para estudar; - para instruir -
se; para ser alguém na vida, enfim, uma série de respostas
que têm como conseqüência a ação. Ação
esta que proporcione vantagens, não uma ação que resulte
em prazer; uma leitura comparada à alimentação que
nós saboreamos conforme nossa fome e nossa disposição
momentânea, em que nós engolimos, devoramos, mastigamos; ler
é pastar, conforme BARTHES ( 1974).
Não podemos ser omissos, quanto à afirmação de que as diferenças de nível econômico acarretam, geralmente, diferenças de possibilidades educativas. Nesse sentido, a ação da leitura de prazer também é afetada por essa diferença, pois o acesso a instrumentos culturais e o tempo de lazer não são estimulados nem entendidos como lazer, hobby, etc., ou simplesmente ignorados como direito ou como necessidade.
A leitura é indiscutivelmente é um problema da sociedade e que não pode ser ignorado pelas autoridades, nem pelos responsáveis pelo desenvolvimento econômico e social do país. No Brasil, segundo pesquisa realizada pela Folha de São Paulo, que teve como objetivo avaliar o hábito de leitura dos brasileiros, os índices de leitura variam de cidade para cidade; mas num contexto geral, 57% dos entrevistados não leram nenhum livro por prazer nos últimos 12 meses; a pesquisa demonstra, ainda, que 85% não leram nenhum livro para escola e 82% não o fizeram por motivo de trabalho. Segundo a pesquisa, apesar das taxas de hábito de leitura serem baixas, 66% dos entrevistados gostariam de ler mais do que costumam fazer, contra 34% que não pretendem aumentar o número de livros que lêem. Este panorama se explica pelo fato de que a demanda social em matéria de capacidade de leitura e escrita aumenta ou diminui conforme se multiplicam as funções sociais e econômicas da leitura e escrita.
Nesse sentido, todo o ato de escrever implica o ler, desta forma, não se pode pensar a escrita separada da leitura, enquanto apropriações de um objeto, neste caso, estamos trabalhando com a realidade, o conhecimento de mundo do homem, realidade concreta que é sempre uma produção humana.
Poderíamos avançar nesses conceitos levando também
em consideração algumas outras hipóteses a respeito
da leitura e da escrita; como, por exemplo, em esforços de pesquisa
como ciência, através da análise e de filosofia, através
da compreensão. Mas, não entraremos por essa linha de reflexão;
apenas queremos apresentar hipóteses como essas que vêm sendo
discutidas há muito tempo e ainda hoje são objetos de trabalho
para muitos pesquisadores. Contudo, queremos ressaltar o fato de que a
leitura não é um produto acabado, pronto e fechado ,mas é
parte importante de todo um processo histórico-social (realidade)
que está relacionado com a escrita.
Como o mercado de trabalho está demandando profissionais qualificados, temos entendido que as exigências em termos de capacidade de leitura serão mais fortes, aumentando a cada dia. Faz-se necessária uma política econômica e social inovadora, pois o pressuposto de que o atraso observado na capacidade de leitura da população, em relação às exigências da tecnologia atual, está diretamente ligado à aprendizagem e à familiaridade com a leitura desde os primeiros anos de escola até aos níveis mais elevados do ensino. Aí também incluímos os alunos de graduação, entendendo desta forma que este fato é um problema social a ser considerado.
Na medida em que estes fatos não estão sendo suficientemente diagnosticados e os riscos de fracasso profissional aumentam, faz-se necessário fundamentar e questionar em nossas pesquisas as disparidades em relação às medidas tomadas formalmente que influenciam de modo direto a aprendizagem da leitura enquanto objeto e sua relação com a formação do indivíduo, num contexto universitário.
Sabemos que estudos já provaram que a leitura recomendada em
determinados cursos universitários, ocupa um espaço relativamente
pequeno, GRANJA(1985). O que vemos é algo nebuloso: as universidades,
escolas e bibliotecas não contribuem no que diz respeito ao hábito
de leitura, não estão cumprindo com seus papéis. Existe
então um problema maior: apesar de serem agências essenciais
para a formação de leitores, não são suficientes
em si mesmas para garantir a evolução da leitura na sociedade,
pois o saber ler não é suficiente, é preciso haver
um projeto social, de estímulo, de orientação ao estudante
para despertar a consciência crítica através da leitura.
O que estamos constatando hoje, diante das problemáticas sociais, econômicas e políticas, é um verdadeiro duelo elite/massa, ou seja, opressor/oprimido. Quando apontamos a falta de incentivo, a escassez no apoio e a raridade do hábito da leitura é porque, detrás de uma "política caolha", existe uma política que "domestica" e dificulta os homens quanto ao exercício da consciência e da razão.
É possível que ações isoladas possam dar resultados a curto prazo, mas seus resultados não serão suficientes, pois ter mais bibliotecas, mais livros e tecnologias de ponta para organização de documentos em diversas instituições, não é o suficiente, embora seja fundamental para desenvolvimento cultural do país. Mas, o fundamental mesmo será fazer com que a população brasileira leia mais, e faça da leitura um instrumento para que cada indivíduo empreenda a conquista da cidadania. Só teremos resultados duradouros quando a leitura for um hábito que se reproduza naturalmente.
Para os estudantes universítários, especificamente no caso da Biblioteconomia, a leitura deve ser um instrumento de informação para o seu desenvolvimento acadêmico e profissional, ou seja, a leitura como instrumento para sua formação, um instrumento de educação permanente e reflexão social. Um meio que permita mudar o panorama geral do país e que possibilite intervir nas grandes decisões nacionais, cuja mediação com a realidade se dará através da leitura.
É importante ressaltar que a democratização da leitura, consequentemente da informação, não pode ser confundida com altos índices estatísticos de produção de livros, de criação de bibliotecas e nem com o crescimento do número de novos leitores ou expansão da leitura, considerando o crescimento da população na rede educacional.
Cabe a nós exercer de forma prática e direta, o nosso papel como agentes sociais e culturais incentivadores e mediadores da leitura, cobrando do Estado uma postura mais comprometida com o desenvolvimento da leitura no país.
Vemos que o Estado, por sua vez, possui uma grande responsabilidade
naquilo que chamamos de crise da leitura, pois não tem apresentado
uma política nesse campo, que atenda à sociedade, sem discriminações.
Nesse sentido, o Estado revela o mesmo descompromisso com a Educação,
quando retrai e diminui os investimentos para o ensino público e
gratuito.
BARROS, Maria Helena T.C. O bibliotecário e o ato de ler, In SILVA, E.T. O bibliotecário e a analise dos problemas da leitura. Campinas Mercado Aberto, Cad. da ALB, 1, 1986, p. 31 - 36.
BARTHES, Roland. O prazer do texto. tradução Margarida Barahona. Lisboa: Edições 70 (Coleção Signos 5), 119p., 1974
FREIRE, Paulo. A importância do ato de ler: em três artigos que se completam. 5ed. São Paulo: Associados, Cortez. 1983.
GRANJA, Elza Corrêa. Contribuições ao estudo da leitura entre estudantes universitários: análise empírica da leitura e do uso da biblioteca entre alunos de graduação do Instituto de Psicologia da USP. São Paulo, 1985 (dissertação de mestrado)USP, São Paulo. 1985.
HOMENS E LIVROS, Folha de São Paulo, ter. 13/ago/1996. Opinião, p. 1 - 2.
KLEIMAN, Angela. Texto e leitor: aspectos cognitivos da leitura. Campinas, São Paulo: Pontes, 1989.
MORAIS, José. A arte de ler. Tradução: Álvaro Lorenami. São Paulo: Unesp, 327p., 1996.
PINHEIRO, Edna Gomes. A renovação da biblioteca através do marketing. R. Comunicação Social. Fortaleza, v.18, n.1, p.23-42, jan./jun.,1988.
SILVA, E.T. Leitura e realidade brasileira. 4ed. Porto Alegre: Mercado Aberto (Série novas perspectivas) 1988, 104p.
Disponibilizado na WWW em 26/10/1998.