Colonialidade e psicanálise: o que ficou de fora das narrativas de origem

Autores

DOI:

https://doi.org/10.5007/2175-7976.2025.e105060

Palavras-chave:

Psicanálise, História, Decolonialidade

Resumo

A era vitoriana é tida como condição político-cultural para o surgimento da psicanálise. As condições históricas que forjaram a era vitoriana são sobre o que não se fala nas narrativas psicanalíticas sobre a sua origem. O período foi indissociável das vidas colonizadas fora da Europa. O exercício burguês de historicizar e perscrutar os eventos sexuais, eróticos e reprodutivos do século XIX contrasta com o silêncio de personalidades como Gustave Flaubert, Friedrich Nietzsche, Karl Marx e Sigmund Freud em relação à obscenidade da violência empreendida nas colônias. Como as heranças daquilo que ficou de fora, na crítica de uma época, atuam no analista brasileiro diante das questões de classe, raça, gênero, deficiência escutadas? Onde a psicanálise, em nossos pagos, reitera colonialismos e onde ela realiza a análise dos limites de seus fundamentos? Correlacionamos obras como A experiência burguesa da rainha Vitória a Freud – a educação dos sentidos, de Peter Gay, A era dos impérios, de Eric Hobsbawm, e Discurso sobre o colonialismo, de Aimé Césaire para compreender o que ficou de fora da história oficial da psicanálise. Assim, antes de reescrever uma história oportuna, decolonial e mais tragável da teoria da qual partimos, trata-se, talvez, de aventar que a experiência colonial tenha sido negada como parte das condições para o surgimento da psicanálise. O estudo relança a psicanálise para as questões do nosso tempo e da nossa geopolítica, para seguir na escrita de sua história.

Biografia do Autor

Camila Maggi Rech Noguez, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Doutoranda em Psicologia Social e Institucional pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Psicóloga da Clínica de Atendimento Psicológico da UFRGS. Porto Alegre, RS, Brasil.

Amadeu de Oliveira Weinmann, Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Pós-doutorado em Psicologia (UFSC). Professor Associado 4 do Departamento de Psicanálise e Psicopatologia do Instituto de Psicologia, Serviço Social, Saúde e Comunicação Humana da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS, Brasil.

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Publicado

2025-12-02

Como Citar

Noguez, C. M. R., & Weinmann, A. de O. (2025). Colonialidade e psicanálise: o que ficou de fora das narrativas de origem. Esboços: Histórias Em Contextos Globais, 32, 1–21. https://doi.org/10.5007/2175-7976.2025.e105060

Edição

Seção

Artigo