Entre Cérebros, Psychés e Culturas: notas para o debate sobre a epistemologia que embasa serviços de saúde mental para imigrantes-refugiadas em São Paulo

Autores

  • Alexandre Branco-Pereira UFSCar

DOI:

https://doi.org/10.5007/2175-8034.2022.e80387

Palavras-chave:

Etnopsiquiatria, Psiquiatria transcultural, Psiquiatria social e cultural, Saúde mental

Resumo

Este ensaio pretende debater os pressupostos te?orico-epistemolo?gicos dos servic?os de sau?de mental denominados culturalmente sensi?veis no Brasil. Abordando autores da etnopsiquiatria francesa, da psiquiatria transcultural estadunidense e da psiquiatria social e cultural canadense, todas vertentes suscitadas pela interlocuc?a?o empreendida com me?dicas psiquiatras, psicanalistas e psico?logas durante pesquisa etnogra?fica, procuro fazer o dia?logo dessas correntes com determinadas elaborac?o?es feitas a partir da antropologia de Le?vi-Strauss e Roy Wagner. Aponto, por fim, para como e? possi?vel resistir a?s reificac?o?es simplistas comuns ao debate proposto desde o campo psi, complexificando as abordagens que costumam condicionar a atribuic?a?o da condic?a?o de sujeito mediante o compartilhamento de estruturas universalmente distribui?das, como ce?rebros, culturas e psyche?s.

Biografia do Autor

Alexandre Branco-Pereira, UFSCar

Doutorando em Antropologia Social pela UFSCar. É coordenador do Observatório Saúde e Migração (https://www.osm.ufscar.br), da Frente Nacional pela Saúde de Migrantes (FENAMI) e da Rede de Cuidados em Saúde para Imigrantes e Refugiados. Atua como pesquisador no Laboratório de Estudos Migratórios (UFSCar), no Promigras – Saúde e Migração (Unifesp) e na Rede Covid-19 Humanidades MCTI. É editor-chefe do Boletim do Observatório Saúde e Migração (www.boletimosm.ufscar.br). As principais áreas de atuação são em antropologia das migrações, antropologia da saúde e dos sistemas de saúde e estudos da ciência e da tecnologia, atuando principalmente nos seguintes temas: refúgio, racialização e racismo, Estado e políticas públicas, sistemas de saúde, ideologização e políticas migratórias, política na e da ciência, estudos da ciência e da técnica, saúde mental, colonialidade e pandemias e epidemias. Atualmente, desenvolve pesquisa sobre o impacto da pandemia de Covid-19 sobre as populações migrantes racializadas, sobre as tensões entre a universalidade e a equidade no sistema de saúde e sobre o nexo entre os paradigmas de sistemas de saúde universais e o racismo durante a pandemia.

Referências

ACHÓTEGUI, Joseba. Emigrar en situación extrema: el síndrome del inmigrante con estrés crónico y múltiple (Síndrome de Ulisses). Revista Norte de Salud Mental de La Sociedad Española de Neuropsiquiatria, Madrid, v. 5, n. 21, p. 39-52, 2004.

BASTIDE, Roger. Sociologia das doenças mentais. [S.l.]: Companhia Ed. Nacional, 1967.

BRANCO-PEREIRA, Alexandre. O refúgio do trauma: notas etnográficas sobre trauma, racismo e temporalidades do sofrimento em um serviço de saúde mental para refugiados. REMHU, Rev. Interdiscip. Mobil. Hum., [s.l.], v. 26, n. 53, p. 79-97, 2018. DOI: https://doi. org/10.1590/1980-85852503880005306.

BRANCO-PEREIRA, Alexandre. Viajantes do tempo: imigrantes-refugiadas, saúde mental, cultura e racismo na cidade de São Paulo. 2019. 175f. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2019.

BRANCO-PEREIRA, Alexandre. Viajantes do tempo: imigrantes-refugiadas, saúde mental, cultura e racismo na cidade de São Paulo. Curitiba: Editora CRV, 2020a. DOI: https://doi.org/ 10.24824/978854444061.2.

BRANCO-PEREIRA, Alexandre. Aculturalidade e hiperculturalide: entre saberes e crenças em um serviço de saúde mental para imigrantes e refugiadas. R@U – Revista de Antropologia da UFSCar, [s.l.], v. 12, n. 1, 2020b. DOI: https://doi.org/10.52426/rau.v12i1.336.

BRANCO-PEREIRA, Alexandre. Autismo e maternidade migrante: psicopatologizando relações em mobilidade. Vivência – Revista de Antropologia, [s.l.], v. 1, n. 56, 2020c. DOI: https:// doi.org/10.21680/2238-6009.2020v1n56ID23676.

BRANCO-PEREIRA, Alexandre. Alucinando uma pandemia: ensaio sobre as disputas pela realidade da Covid-19. Horizontes Antropológicos, [s.l.], ano 27, n. 59, 2021. DOI: https:// doi.org/10.1590/S0104-71832021000100007.

CABOT, Heath. The social aesthetics of eligibility: NGO aid and indeterminacy in the Greek asylum process. American Ethnologist, [s.l.], v. 40, n. 3, p. 452-466, 2013.

CALLON, Michel; LATOUR, Bruno. Don’t throw the baby out with the Bath school! A reply to Collins and Yearley. In: PICKERING, Andrew. (org.). Science as practice and culture. Chicago: University of Chicago Press, 1992.

CARSTEN, Janet. Culture of relatedness: new approaches to the study of kinship. Cambridge: Cambridge University Press, 2000.

CARVALHO, Luciana Andrade. Cuidados em saúde mental para imigrantes e refugiados: reflexões a partir da experiência em um centro terciário. In: XI REUNIÃO DE ANTROPOLOGIA DO MERCOSUL, no Grupo de Trabalho n. 95: Antropología, movilidad y salud. Montevideo, Uruguai, 2015. Anais [...]. Uruguai, 2015.

CARVALHO, Luciana Andrade et al. Serviços de saúde mental para imigrantes e refugiados na cidade de São Paulo: contribuições para o debate. TRAVESSIA – Revista do Migrante, [s.l.], ano XXXI, n. 84, 2018.

DANTAS, Sylvia Duarte. (org.). Diálogos interculturais: reflexões interdisciplinares e intervenções psicossociais. São Paulo: Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, 2012.

DANTAS, Sylvia Duarte. Saúde, interculturalidade e imigração. Revista USP, [s.l.], v. 114, p. 55-70, 2017.

DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? 3. ed. São Paulo: Editora 34, 2010.

DESAI, Geertha; CHATUVERDI, Santosh K. Idioms of distress. Journal of Neurosciences in Rural Practice, [s.l.], v. 8, n. 1, p. 94-97, 2017.

DESCOLA, Philippe. As duas naturezas de Lévi-Strauss. Sociologia e Antropologia, [s.l.], v. 1, n. 2, p. 35-51, 2011.

DEVEREUX, Georges. Baubo, la vulve mythique. Paris: Payot, 2011.

DEVEREUX, Georges. L’ethnopsichiatrie. Ethnopsychiatrica 1.1, [s.l.], Revue Semestrielle Bilingue, p. 7, 1978.

DURKHEIM, Émile. Representações individuais e representações coletivas. In: DURKHEIM, Émile. Sociologia e Filosofia. São Paulo: Ícone, 1994. p. 9-54.

FASSIN, Didier. The biopolitics of otherness: undocumented foreigners and racial discrimination in french public debate. Anthropology Today, [s.l.], v. 17, n. 1, 2001. FASSIN, Didier. Another politics of life is possible. Theory, Culture & Society, [s.l.], v. 26, n. 5, p. 44-60, 2009.

FASSIN, Didier; RECHTMAN, Richard. The empire of trauma: an inquiry into the condition of victimhood. Princeton: Princeton University Press, 2009.

FASSIN, Didier; D’HALLUIN, Estelle. The truth from the body: medical certificates as ultimate evidence for asylum seekers. American Anthropologist, [s.l.], v. 107, n. 4, p. 597-608, 2005.

FERREIRA, Jorge Flávio. Retificando a psiquiatria transcultural: novas odisséias nas entrelinhas do Estado, da saúde e da imigração em Espanha e na União Européia. Revista de Antropologia da UFSCar, v. 4, n. 2, p. 95-106, 2012.

FERREIRA, Jorge Flávio. Negociar a cura: enquadramentos da doença em uma clínica psiquiátrica transcultural – um estudo de caso. Revista de Antropologia Social dos Alunos do PPGAS-UFSCar, São Carlos, v. 3, n. 1, p. 145-170, 2011.

FILHO, Maurício Siqueira. O centro, o círculo e o vínculo: sobre Tobie Nathan e as técnicas de influência. 2016. 102f. Dissertação (Mestrado em Antropologia Social) – Museu Nacional, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2016.

GALINA, Vivian Fadlo et al. A saúde mental dos refugiados: um olhar sobre estudos qualitativos. Interface (Botucatu), [on-line], v. 21, n. 61, p. 297-308, 2017.

GONZALEZ, Lélia. Racismo e sexismo na cultura brasileira. Revista Ciências Sociais Hoje, [s.l.], ANPOCS, p. 223-244, 1984.

HARAWAY, Donna. A giant bumptious litter: Donna Haraway on truth, technology, and resisting extinction. Logic, [s.l.], Issue 9, Nature, 2019. Disponível em: https://logicmag.io/ nature/a-giant-bumptious-litter/. Acesso em: 22 abr. 2020.

KIRMAYER, Laurence. Beyond the ‘new cross-cultural psychiatry’: cultural biology, discursive psychology and the ironies of globalization. Transcultural Psychiatry, [s.l.], v. 43, n. 1, p. 126-144, 2006.

KIRMAYER, Laurence et al. Explaining medical unexplainable symptoms. The Canadian Journal of Psychiatry, [s.l.], v. 49, n. 10, 2004.

KIRMAYER, Laurence; MINAS, Harry. The future of cultural psychiatry: an international perspective. The Canadian Journal of Psychiatry, [s.l.], v. 45, p. 438-446, 2000.

KLEINMAN, Arthur. Everything that really matters: social suffering, subjectivity, and the remaking of human experience in a disordering world. Harvard Theological Review, [s.l.], v. 90, n. 3, p. 315-336, 1997.

KLEINMAN, Arthur. Concepts and a model for the comparison of medical systems as cultural systems. Social Sciences and Medicine, [s.l.], v. 12, p. 85-93, 1978.

KLEINMAN, Arthur. The illness narratives: suffering, healing, and the human condition. [S.l.]: Basic Books, 1988.

KLEINMAN, Arthur; EISENBERG, Leon; GOOD, Byron. Culture, illness, and care: clinical lessons from anthropological and cross-cultural research. Focus, [s.l.], v. IV, n. 1, 2006. KLEINMAN, Arthur; DAS, Veena; LOCK, Margaret M. Social suffering. 1. ed. California: University of California Press, 1997.

KOHN, Eduardo. How forests think: toward an anthropology beyond the human. Berkeley: University of California Press, 2015.

KNOBLOCH, Felicia. Impasses no atendimento e assistência do migrante e refugiados na saúde e na saúde mental. Psicologia USP, [s.l.], v. 26, n. 2, 2015.

LATOUR, Bruno. Ethnography of a “high-tech” case: about Aramis. In: LEMMONIER, Pierre [org.]. Technological choices: transformation in material cultures since the Neolithic. Londres: Routledge, 2006.

LATOUR, Bruno. Reflexão sobre o culto moderno dos deuses fe(i)tiches. Santa Catarina: EDUSC, 2002. p. 372-398

LÉVI-STRAUSS, Claude. Antropologia estrutural. 1. ed. São Paulo: Cosac Naify, 2012a. Coleção Portátil.

LÉVI-STRAUSS, Claude. A antropologia diante dos problemas do mundo moderno. São Paulo: Companhia das Letras, 2012b.

MACHADO, Igor José de Renó. Sobre os processos de exotização na imigração internacional brasileira. Revista de Antropologia, São Paulo, v. 51, n. 2, 2008.

MACHADO, Igor José de Renó. Parentesco e diferencialidades: alternativas à identidade e às fronteiras étnicas no estudo das migrações. In: UNIFESP MIGRAÇÕES: FLUXOS, CONTROLES E POLÍTICAS PÚBLICAS; MIGRAÇÕES: FLUXOS, CONTROLES E POLÍTICAS PÚBLICAS, Universidade Federal de São Paulo, Guarulhos, 2013. Anais [...]. Guarulhos, São Paulo, 2013.

MARTINS-BORGES, Lucienne. Migração involuntária como fator de risco à saúde mental. Revista Interdisciplinar da Mobilidade Humana (REHMU), [s.l.], v. 21, n. 40, p. 151-162, 2013.

MEAD, Margaret; BENEDICT, Ruth; SAPIR, Edward. Cultura e personalidade. (obra organizada por Celso Castro). São Paulo: Zahar, 2013.

MORO, Marie-Rose. Psicoterapia transcultural da migração. Psicologia USP, [s.l.], v. 26, n. 2, 2015.

MORO, Marie-Rose. "La clínica transcultural tiene necesidad del grupo para sanar". In: EVENTO DE PSICANÁLISE E ANTROPOLOGIA, SOCIEDADE BRASILEIRA DE PSICANÁLISE DE SÃO PAULO, 2018. Anais [...]. São Paulo, 2018.

PUSSETTI, Chiara. Identidades em crise: imigrantes, emoções e saúde mental em Portugal. Saúde e Sociedade, São Paulo, v. 19, n. 1, p. 94-113, 2010.

PUSSETTI, Chiara. “O silêncio dos inocentes”: os paradoxos do assistencialismo e os mártires do mediterrâneo. Revista Interface (Botucatu), [s.l.], v. 21, n. 61, p. 263-272, 2017.

PUSSETTI, Chiara et al. Migrantes e saúde mental: a construção da competência cultural. Lisboa, PT: Alto-Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural, 2009.

RUSSO, Jane; VENÂNCIO, Ana Teresa A. Classificando as pessoas e suas perturbações: a “revolução terminológica” do DSM III. Revista Latino-Americana de Psicopatologia Fundamental, [s.l.], v. 9, n. 3, 2006.

STENGERS, Isabelle. An ecology of practices. Cultural Studies Review, [s.l.], v. 11, n. 1, 2005.

STENGERS, Isabelle. Cosmopolitcs I. Tradução para o inglês de Robert Bononno. Minessota: University of Minessota Press, 2011a.

STENGERS, Isabelle. Cosmopolitcs II. Tradução para o inglês de Robert Bononno. Minessota: University of Minessota Press, 2011b.

STRATHERN, Marilyn. No limite de uma certa linguagem: entrevista concedida a Eduardo Viveiros de Castro e Carlos Fausto. Mana, Rio de Janeiro, v. 5, n. 2, 1999.

VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Metafísicas canibais: elementos para uma antropologia pós-estrutural. São Paulo: Ubu Editora; n-1 edições, 2018. 288p.

VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. O nativo relativo. Mana, Rio de Janeiro, v. 8, n. 1, p. 113-148, 2002.

VIVEIROS DE CASTRO, Eduardo. Os pronomes cosmológicos e o perspectivismo ameríndio. Mana, Rio de Janeiro, v. 2, n. 2, p. 115-144, 1996.

WAGNER, Roy. A invenção da Cultura. São Paulo: Cosac Naify, 2012.

WAGNER, Roy. Símbolos que representam a si mesmos. Traduzido por Priscila Santos da Costa. São Paulo: Editora Unesp, 2017.

Downloads

Publicado

2022-05-26

Como Citar

BRANCO-PEREIRA, Alexandre. Entre Cérebros, Psychés e Culturas: notas para o debate sobre a epistemologia que embasa serviços de saúde mental para imigrantes-refugiadas em São Paulo. Ilha Revista de Antropologia, Florianópolis, v. 24, n. 2, p. 174–197, 2022. DOI: 10.5007/2175-8034.2022.e80387. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/ilha/article/view/80387. Acesso em: 29 mar. 2024.

Edição

Seção

Artigos