História social, contato e a aquisição do português brasileiro como L2

Autores/as

  • Maria Eugenia Lammoglia Universidade Federal do Rio de Janeiro

Palabras clave:

História social, Contato linguístico, Aquisição de L2, Português brasileiro, Português europeu

Resumen

Este artigo reinterpreta resultados de análises contrastivas de peças de teatro portuguesas e brasileiras escritas ao longo dos séculos XIX e XX, levando em conta informações sobre os quase quatrocentos anos de colonização do Brasil, em que a presença de escravizados africanos e seus descendentes, sempre superior à de imigrantes portugueses, e o contato entre eles foi intenso. A grande mobilidade populacional propiciada pelas atividades nos engenhos, no garimpo, na cultura cafeeira, entre outras, contribuiria para a miscigenação e a propagação do português por esse grande contingente, formado majoritariamente por analfabetos, tanto os escravos e trabalhadores portugueses quanto portugueses os donos de terras e suas famílias. Os letrados constituíam uma parte ínfima da população, que aprendia o português em Coimbra ou em escolas só acessíveis a uma elite privilegiada. Além da deriva do português arcaico, um fruto desse contato é a emergência de uma variedade do português com significativa contribuição africana, muitas vezes ignorada, porque a escrita produzida por uma minoria não dava espaço ao português geral aqui aprendido como L2. O lento processo de acesso à escola, só iniciado a partir da virada do século XIX, seguindo o modelo lusitano, ainda hoje presente nos livros didáticos, produziria uma diglossia no Brasil entre o português oral e o escrito. Evidências empíricas dessas duas gramáticas são observadas na semelhança entre a escrita portuguesa e brasileira dos anos 1800 e quase metade dos anos 1900, quando finalmente, a gramática brasileira começa a mostrar sua face. Só com o desenvolvimento dos estudos linguísticos com base em gravações a partir dos anos 1970, vemos a confirmação de que os mesmos traços que caracterizam a sintaxe do português brasileiro urbano, “culto” ou “popular”, são atestados nas peças do último quartel do século XX.

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Publicado

2025-08-27