Ética das pesquisas envolvendo pessoas com transtornos mentais maiores

Autores

DOI:

https://doi.org/10.5007/1677-2954.2021.e80051

Resumo

Este trabalho tem como objetivo examinar conceitualmente e de modo razoavelmente bem-informado cientificamente, a inter-relação entre vulnerabilidade mental e capacidade de decisão racional e autônoma, apresentando aspectos bioéticos relevantes, com base neste exame, mas, também, em princípios éticos consolidados, para se refletir e deliberar sobre a pertinência de pesquisas com pessoas acometidas por transtornos mentais maiores, em psiquiatria, psicologia e neurociências em geral. Depois de destacar aspectos éticos gerais da ética em pesquisa com seres humanos, o artigo examina se indivíduos com transtornos mentais maiores, a exemplo do transtorno depressivo maior, podem ser considerados efetivamente racionais, autônomos e responsáveis, se são dotados de autonomia responsável racional. Por fim, destacamos aspectos bioéticos relacionados à vulnerabilidade e racionalidade prática relacionados ao tema. Os vários aspectos teóricos e práticos destacados aqui nos parecem cruciais, e sugerem o esboço de questões e conceitos que precisam ser melhor aprofundados pelas neurociências da ética e pela ética das neurociências.

Biografia do Autor

Alcino Eduardo Bonella, Professor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Uberlândia, Minas Gerais (M.G)

Professor do Instituto de Filosofia (IFILO) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), pesquiso e leciono na Graduação em Filosofia, no Programa de PósGraduação em Filosofia (Mestrado), e no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde (Mestrado e Doutorado). Trabalho nas seguintes áreas: metaética, ética normativa, ética prática, bioética, filosofia da biologia, filosofia da mente. Pesquiso e me interesso pelos seguintes assuntos: racionalidade, normatividade, naturalismo, valor da vida, ética na pesquisa (com embriões, fetos, animais, crianças, esportistas), aborto, infanticídio, eutanásia, melhoramento humano, saúde pública, pobreza, mudança climática. Também me interessam estudos empíricos sobre placebo, comparação de tratamentos com e sem uso de drogas, bem-estar animal, absorção de vitamina B12, dietas, consentimento presumido, doação de órgãos, FIV. Sou membro da International Society of Bioethics (IAB), da Sociedade Brasileira de Bioética (SBB), do Núcleo de Estudos do Pensamento Contemporâneo (UFMG/Fapemig), e pesquisador do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - Produtividade em Pesquisa). E-mail: abonella@ufu.br

Gabriela Franco de Almeida, Professora da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG), Ituiutaba, Minas Gerais (M.G)

Psicóloga clínica, doutora em Ciências da Saúde, professora da Universidade do Estado de Minas Gerais (UEMG). É co-fundadora da clínica Margem da Palavra e idealizadora do Circuito Básico de Formação em Acompanhamento Terapêutico. Pesquisa e trabalha a partir da perspectiva existencial-humanista, com interesse especial por qualidade de vida e qualidade de morte. E-mail: gabrielafrancoalmeida@hotmail.com

Leonardo Ferreira Almada, Professor da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Uberlândia, Minas Gerais (M.G.)

Professor Associado II do Instituto de Filosofia e do Programa de Pós-graduação em Filosofia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Uberlândia, Minas Gerais (M.G.), Brasil. Doutor e Mestre em Filosofia pelo Programa de Pós Graduação em Filosofia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Bacharel em Filosofia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professor Associado II do Instituto de Filosofia e do Programa de Pós-graduação em Filosofia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), Uberlândia, Minas Gerais (M.G.), Brasil. Atua na área de Filosofia da Mente, Filosofia da Psicologia e Filosofia das Neurociências. E-mail: umamenteconsciente@gmail.com

Referências

AKECHI, Tatsuo; OKAMURA, Hitoshi; YAMAWAKI, Shigeto; UCHITOMI, Yosuke. Why do some cancer patients with depression desire na early death and others do not? Psychosomatics, v. 42, n. 2, p. 141-145, 2001.

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. DSM-IV. Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. 4ª. ed. Porto Alegre, RS: ARTMED, 2002.

AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. DSM-V. Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders. 5ª ed. Arlington, VA: American Psychiatric Association, 2013.

BEAUCHAMP, Tom. The Principle of Beneficence in Applied Ethics. In: ZALTA, Edward N. The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Spring 2019 Edition). Disponível em: https://plato.stanford.edu/archives/spr2019/entries/principle-beneficence/. Acesso em 07 mar. 2021.

BEAUCHAMP, T. L. & CHILDRESS, J. F. Principles of Biomedical Ethics. Oxford, Oxford University Press, 2013.

BLEULER, Eugen. Dementia praecox, or the group of Schizophrenias. New York, NY: International University Press, 1911.

BONELLA, Alcino Eduardo. A ética dos testes clínicos de desafio humano na avaliação de vacinas e tratamentos para a COVID-19. In: TAUCHEN, Jair; CASTANHEIRA, Nuno; OLIVEIRA, Nythamar de. (Org.) Bioethics & neuroethics in global pandemic times. (pp. 15-30). Porto Alegre, RS: Fundação Fênix, 2020.

BORTOLOTTI, Lisa. Rationality and sanity: the role of rationality judgments in understanding psychiatric disorders. In: FULFORD, K. W. M.; DAVIES, Martin; GIPPS, Richard G. T.; GRAHAM, George; SADLER, John Z.; STANGHELLINI, Giovanni; THORNTON, Tim. The Oxford Handbook of Philosophy and Psychiatry (p. 480-496). Oxford, UK: Oxford University Press, 2013.

BREGGIN, Peter Roger. Psychotherapy as applied ethics. Psychiatry, v. 34, p. 59-74, 1974.

BREGGIN, Peter Roger. Psychiatry and psychotherapy as political processes. American Journal of Psychotherapy, v. 29, 369-382, 1975.

BUSS, Sarah; WESTLUND Andrea. Personal Autonomy. In: ZALTA, Edward (ed.). The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Spring 2018 Edition). Disponível em: https://plato.stanford.edu/archives/spr2018/entries/personal-autonomy/. Acesso em 22 fev. 2021.

CORDEIRO, Franciele Roberta. Eu Decido o Meu Fim? A mídia e a produção de sujeitos que governam a sua morte. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) – Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, RS: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 160 f. 2013.

COYLE, Ness; SCULCO, Louis. Expressed desire for hastened death in seven patients living with advanced cancer: a phenomenologic inquiry. Oncology Nursing Forum, v. 31, n. 4, p. 699-709, 2004.

DIERICKX, Sigrid; DELIENS, Luc; COHEN, Joachim; CHAMBAERE, Kenneth. Euthanasia in Belgium: trends in reported cases between 2003 and 2013. CMAJ, v. 188, n. 16, p. 407-414, 2016.

GALBRAITH, Kim M; DOBSON, Keith. The role of the psychologist in determining competence for assisted suicide/euthanasia in the terminally ill. Canadian Psychology, v. 41, n. 3, p. 174-183, 2000.

GEORGE, Constance E. When Is Depression a Terminal Illness? deliberative suicide in chronic mental illness. AMA Journal of Ethics, v. 18, n. 6, p. 594-600,2016.

GRISSO, Thomas; APPELBAUM, Paul S. Assessing Competence to Consent to Treatment: A guide for Physicians and Other Health Professionals. New York, NY: Oxford University Press, 1998.

GUY, Maytal; STERN, Theodore A. The Desire of Death in the Setting of Terminal Illness: a case discussion. Primary Care Companion to The Journal of Clinical Psychiatry, v. 8, n. 5, p. 299-305, 2006.

HINDMARCH, Thomas; HOTOPF, Matthew; OWEN, Gareth S. Depression and decision-making capacity for treatment or research: a systematic review. BMC Med Ethics, v. 14, n. 54, p. 1-10, 2013.

NYS, Thomas. Autonomy, Trust and Respect. The Journal of Medicine and Philosophy, v. 41, n. 1, p. 10-24, 2016.

EDWARDS, Rem Blanchard (1981). Mental health as rational autonomy. Journal of Medicine and Philosophy, v. 6, n. 3, p. 309–322, 1981.

EDWARDS, Rem Blanchard (Ed.). Ethics and Psychiatry: Insanity, Rational Autonomy, and Mental Health Care. 2ª ed. Amherst, New York: Prometheus Books, 1997 [1982].

ENGELHARDT Jr., Hugo Tristam. Psychotherapy as meta-ethics. Psychiatry, v. 36, p. 440-445, 1973.

FINGARETTE, Herbert. Insanity and responsibility. Inquiry, v. 15, p. 6-29, 1972.

GATHER, Jakov; VOLLMANN, Jochen. Physician-assisted suicide of patients with dementia: a medical ethical analysis with a special focus on patient autonomy. International Journal of Law and Psychiatry, v. 36, n. 5-6, p. 444-453, 2013.

HUGHES, Jonathan; HUNTER, David; SHEEHAN, Mark; WILKINSON, Stephen; WRIGLEY, Anthony. European Textbook on Ethics in Research. Luxembourg: Publications Office of the European Union; 2010

KLÜBER-ROSS, Elisabeth. Sobre a morte e o morrer. São Paulo, SP: Martins Fontes; 2008.

MEYNEN, Gerben. Free will and mental disorder: exploring the relationship. Theoretical medicine and Bioethics, v. 31, n. 6, p. 429-443, 2010.

MOORE, Michael S. Some myths about "Mental illness"'. Archives of General Psychiatry, v. 32, p. 1483-1497, 1975.

PANZINI, Raquel Gehrke; ROCHA, Neusa Sicca da; BANDEIRA; Denise Ruschel FLECK, Marcelo Pio de Almeida. Qualidade de vida e espiritualidade. Revista de Psiquiatria Clínica, v. 34, n. 1, p. 105-115, 2007.

PELBART, Peter Pál. Da clausura do fora ao fora da clausura: loucura e desrazão. São Paulo, SP: Iluminuras, 2009.

RADDEN, Jennifer. Mental Disorder (Illness). In: ZALTA, Edward (ed.). The Stanford Encyclopedia of Philosophy (Winter 2019 Edition). Disponível em: https://plato.stanford.edu/archives/win2019/entries/mental-disorder. Acesso em 22 fev. 2021.

RADOILSKA, Lubomira (Ed.). Autonomy and Mental Disorder. Oxford, UK: Oxford University Press, 2012.

RAIJMAKERS, Natasja Johanna Helana; HEIDE, Agnes van der; KOUWENHOVEN, Pauline S. C.; van THIEL, Ghislain; van DELDEN, Joahnes J; Rietjens, JUDITH A. C. Assistance in dying for older people without a serious medical condition who have a wish to die: a national cross-sectional survey. Journal of Medical Ethics, v. 41, n. 2, p. 145-150, 2015.

RATCLIFFE, Matthew. Depression and the phenomenology of free will. In: In: FULFORD, K. W. M.; DAVIES, Martin; GIPPS, Richard G. T.; GRAHAM, George; SADLER, John Z.; STANGHELLINI, Giovanni; THORNTON, Tim. The Oxford Handbook of Philosophy and Psychiatry. Oxford, UK: Oxford University Press, 2013, p. 574-591.

SADLER, John Z.; FULFORD, K. W. M.; van STADEN, Cornelius Werendly (eds.). The Oxford Handbook of Psychiatric Ethics. Oxford, UK: Oxford University Press, 2015.

SILVA, Luiz Felipe da Cunha e. Crônica de uma morte adiada: o tabu da morte e os limites não científicos da ciência. Revista Bioética, v. 23, n. 2, p. 331-339, 2015.

SZASZ, Thomas. Insanity: the idea and its consequence. Syracuse, NY: Syracuse University Press, 1997.

WALTER, Henrik. Neurophilosophy of free will: From libertarian illusions to a concept of natural autonomy. Cambridge, MA: MIT Press, 2001.

Downloads

Publicado

2021-04-30