Confabulando o agora para mirar no amanhã: a não binariedade como outras inteligibilidades
DOI:
https://doi.org/10.5007/1984-8412.2024.e102445Palavras-chave:
Movimento não binário, Cis-heteronormatividade, Confabulação, Vidas não bináriasResumo
O presente ensaio tem como objetivo compreender os contornos e as implicações do movimento não binário e as contribuições na construção de um campo de saber-poder que desestabilize, desconstrua inteligibilidades cis-heteronormativas. Assim, o foco recai nas experiências e vivências das pessoas não binárias fortalecendo o caráter plural e democrático por meio da garantia de direitos, do reconhecimento e do aprendizado e respeito com os corpos cis-heterodissidentes na sociedade brasileira. Esse campo de produção de saber e político tem como referências o paradigma Pós-Estruturalista, a Teoria da Performatividade e do Transfeminismo relacionadas aos gêneros e à denúncia da cisgeneridade como ficcional e arbitrária nas inteligibilidades sociais, nas produções acadêmicas e nas suas manifestações políticas em vários espaços, sobretudo, na instituição escolar. Assim, a compreensão das vidas que excedem uma lógica binária, dicotômica, excludente e hierarquizada (sexo, gênero e sexualidade) contribui para dar visibilidade, acabar com silenciamentos e historicídios das pessoas cis-heterodissidentes que estão no fronte da não binariedade. Nesse caminho, o ensaio sublinha outros discursos, saberes-poderes, contranarrativas que resistem às violências por meio de desobediências e desestabilizações do Cistema. Como ferramenta para elaboração das reflexões, utilizou-se a confabulação como verbo de conspiração, de armadilha e de criação de estratégias para sobreviver e contestar a cis-heteronormatividade. Desta forma, confabulando o agora para mirar no amanhã é uma tentativa de formular perguntas, construir outros saberes tendo como protagonistas as pessoas trans nos engendramentos de outras verdades comprometidas a pluralidade e democracia. Ressaltamos, ainda, que nós pessoas não binárias somos produtoras de engrenagens outras que possibilitam desestabilizar o Cistema, desenferrujando as porcas e ruelas e, se for preciso, utilizando outras peças, na estrutura social concebida como essencialista e ontológica, que já estão gastas e não podem e nem devem perpetuar exclusões e não reconhecimento. É se alojando nas camadas internas dessa estrutura social ainda hegemônica que podemos modificá-la, de dentro para fora. Seremos, portanto, líquido corrosivo para corroer esse Cistema podre.
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