Internações compulsórias e restrição da liberdade de pessoas que usam drogas

Autores

DOI:

https://doi.org/10.1590/1982-0259.2023.e91592

Palavras-chave:

internação compulsória, judicialização da saúde, drogas, saúde mental

Resumo

Este artigo analisa as justificativas do Poder Judiciário em suas determinações para as internações compulsórias de pessoas que usam drogas, problematizando a judicialização da saúde, a restrição de liberdade e a abstinência presentes nas decisões judiciais, que expressam características do Estado penal-punitivo. Consiste em pesquisa documental envolvendo processos da Secretaria de Saúde do Estado do Espírito Santo encaminhados pelo judiciário, com medidas que imputam “tratamento” aos usuários de drogas em instituição de internação. Os principais resultados indicaram que em todos os 54 processos estavam presentes o pensamento biomédico, 39 justificativas manifestavam o pensamento jurídico-punitivo; e, apenas três justificativas apresentavam a perspectiva de direitos humanos. Percebe-se que a judicialização, a partir das medidas de internação compulsória, pode contribuir com o processo de exclusão e de violação das garantias fundamentais; conduzindo ao aumento do uso de drogas, que deve ser enfrentado com políticas públicas que reconstruam os direitos sociais.

Biografia do Autor

Mirian Cátia Vieira Basílio Denadai, Ufes

Assistente social, doutora em Serviço Social (Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ). Professora do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

Edineia Figueira dos Anjos Oliveira, Universidade Federal do Espírito Santo

Pós-doutorado em Política Social pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES)
Pesquisadora do grupo FENIX da Universidade Federal do Espírito Santo debatendo política de saúde e
saúde mental.

Maria Lúcia Teixeira Garcia

Assistente social, doutora em Psicologia Social ((Universidade de São Paulo - USP). Professora do Programa de Pós-Graduação em Política Social e do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES). Pesquisadora do CNPq e coordenadora do Grupo de Estudos em Políticas Públicas ‘Fênix’ da UFES.

Fabíola Xavier Leal

Assistente social, doutora em Política Social (Universidade Federal do Espírito Santo – UFES). Professora do Programa de Pós-Graduação em Política Social e do Departamento de Serviço Social da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES).

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Publicado

2023-07-17