Experiências que tangenciam o (in)visível e a mobilidade: etnografias em diálogo

Autores

DOI:

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2019v27n366982

Resumo

O processo de entrecruzamento de perspectivas e análises de duas pesquisadoras é o foco
da discussão deste texto. Nele são discutidas as inquietações e questionamentos diante de solicitações experimentadas durante o trabalho etnográfico caracterizado pela longa duração tanto entre os Dogon (no Mali) como entre os Tsonga (no sul de Moçambique). Nas experiências aqui retrabalhadas são indicadas nuances de apreensão de experiências ligadas à loucura, à incapacidade reprodutiva, à migração e a um conjunto de dinâmicas de saberes endógenos em situações de crise e sofrimento individual e social. Na análise, as autoras atentam para o movimento do imaginário e da criatividade, assumindo, de modo complementar, uma releitura reflexiva como maneira de cumprir travessias epistemológicas para o entendimento de questões densas de sentido e de ambiguidades que emergiram
em estudos de campo. Tornou-se relevante para ambas as pesquisadoras o recurso a estratégias sensíveis para acesso ao mundo imaginal – desenho, fotografia e construção fílmica –, inscrevendo produções expressivas na interpretação antropológica como possibilidades interculturais no contexto do trabalho etnográfico. As referências culturais e epistêmicas geram percepções contrastantes, por vezes ininteligíveis, demandando recurso a linguagens não lineares no que concerne a noções ligadas aos domínios do não visível e a formas de elaboração da mobilidade em meio às sombras lançadas nas construções intersubjetivas.

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Biografia do Autor

Denise Dias Barros, Universidade de São Paulo

Doutora em Sociologia pela Universidade de São Paulo. Aposentou-se pela Universidade de São Paulo onde trabalhou entre 1985 e 2015. Atua como orientadora no Programa de pós-graduação Interunidades em Estética e História da Arte da USP. Realizou pesquisas sobre o tratamento social da loucura, migração, arte e antropologia,tendo como campo a sociedade Dogon, Mali. Desde 2010, dedica-se a estudos sobre expressões culturais tamacheque e mobilidade no continente africano.

Esmeralda Celeste Mariano, Universidade Eduardo Mondlane

Desde 1999 realiza pesquisas sociais e consultorias, oferecendo cursos de treinamento para instituições acadêmicas em programas nacionais e internacionais de desenvolvimento sobre temas relacionados às noções de corpo, dinâmicas de gênero e sexualidade, violência pública e íntima, saúde sexual e reprodutiva e direitos, na interface entre a biomedicina e medicina tradicional em Moçambique.

Doutora em Antropologia Social e Cultural pela Universidade Católica de Leuven (KULeuven), no Instituto para a Pesquisa Antropológica em África (IARA), Bélgica. Desde 2005 é docente no Departamento de Arqueologia e Antropologia (DAA) da Faculdade de Letras e Ciências Sociais (FLCS) da Universidade Eduardo Mondlane (UEM), nos programas de graduação e da pós-graduação nas Faculdades de Letras e Ciências Sociais e de Medicina(Saúde Pública) da UEM.Suas principais áreas de pesquisa vertem sobre os temas da saúde, corpo, género, sexualidade e saberes da medicina tradicional. Desde 2013, está envolvida em projetos de pesquisa multidisciplinares sobre o património natural e cultural marinho no Canal de Moçambique.

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Publicado

2019-12-20

Como Citar

Barros, D. D., & Mariano, E. C. (2019). Experiências que tangenciam o (in)visível e a mobilidade: etnografias em diálogo. Revista Estudos Feministas, 27(3). https://doi.org/10.1590/1806-9584-2019v27n366982

Edição

Seção

Seção Temática Nações e Memórias em Transe: Moçambique, África do Sul e Brasil