O sistema de tratamento em cartas baianas: uma análise sobre a posição de sujeito
DOI:
https://doi.org/10.5007/1984-8420.2019v20n2p109Resumo
Este artigo apresenta uma análise do sistema de tratamento na posição de sujeito, evidenciado em 91 cartas pessoais baianas produzidas entre 1906-2000 por sertanejos pouco escolarizados. A amostra foi editada por Santiago (2012), que, a partir do estudo de Marquilhas (2000), caracteriza os redatores como “inábeis”, isto é, escreventes situados em fase inicial de aquisição da escrita. Nesse sentido, busca-se contribuir com o mapeamento do sistema pronominal da língua portuguesa, descrevendo, em um corpus representativo da variedade português popular brasileiro (PPB), a alternância entre as formas de referência à segunda pessoa do discurso, identificando as estratégias que condicionam os usos das formas de tratamento pelos remetentes das cartas através da Teoria do Poder e Solidariedade (BROWN; GILMAN, 1960). Sendo assim, esta pesquisa encontra-se inserida no âmbito da Linguística Histórica sócio-histórica (MATTOS E SILVA, 2008a), que contempla os fatores extralinguísticos, ou sociais, e os intralinguísticos, e da análise através do aparato metodológico da Sociolinguística Variacionista (WEINREICH; LABOV; HERZOG, 2006 [1968]; LABOV, 2008 [1972]). De acordo com Lopes e Cavalcante (2011), com base em Scherre et al. (2009; 2015), o português brasileiro (PB) é constituído por três subsistemas de tratamento na posição de sujeito: (I) você, (II) tu, (III) você – tu. Os dados analisados revelaram na amostra o emprego das formas tratamentais o/a senhor/a, vosmecê, você e tu. Entretanto, demonstrou-se vigorar nas cartas de sertanejos baianos o subsistema tratamental exclusivo de você, que se comporta como estratégia mais solidária, empregada especialmente em relações sociais do tipo simétrico.
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