Maternagem e magistério: a construção da professora-mãe no discurso sobre a docência no Brasil
DOI:
https://doi.org/10.5007/1984-8412.2024.e98692Palavras-chave:
Discurso, Maternidade, DocênciaResumo
A rede discursiva sobre a aptidão feminina para o cuidado e para o ensino consolidou, historicamente, o ideário de uma inclinação natural da mulher para a formação de crianças e de jovens. Tais discursos, associados ao fenômeno da urbanização, atuaram no processo de “feminização do magistério” no Brasil, sobretudo a partir do século XIX, quando a entrada da mulher no mercado de trabalho se tornou um imperativo. A docência surge, nesse contexto, como um modo de justificar a transição das mulheres do âmbito doméstico para o profissional, sem que fosse necessário afastá-las de seu destino primordial: maternar e educar. Nesse ínterim, o objetivo do artigo é cartografar o funcionamento discursivo responsável pela constituição do sujeito professora-mãe nos discursos sobre a docência no Brasil. Para tanto, mobilizaremos uma rede enunciativa que perpassa os séculos XIX, XX e XXI, em cujas materialidades analisaremos o modo como as relações de saber e de poder produziram primeiramente a mulher-mãe e o modo como essa mulher-mãe, na sequência, ofereceu condições de possibilidade à professora-mãe: uma educadora nata, maternal e amorosa. O aporte teórico metodológico da pesquisa está ancorado nos Estudos Discursivos Foucaultianos.
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