Ler em voz alta: práticas de ensino no secundário e a formação cultural das elites brasileiras no século XX
DOI:
https://doi.org/10.5007/1984-8420.2021e71360Resumo
Neste artigo, nosso objetivo é analisar representações do ensino da leitura nas aulas de português do curso secundário brasileiro, manifestas em livros escolares editados na primeira metade do século XX, de modo a depreender as práticas de leitura que eram priorizadas, tendo em vista a função sociocultural, distintiva e hierarquizadora da escola secundária nesse período, destinada prioritariamente às elites dirigentes do país. Subsidiados por princípios e reflexões da História Cultural da leitura e a partir de um corpus constituído com obras didáticas adotadas no secundário, a saber, Céu, terra e mar (1914), de Alberto de Oliveira, Manual de califasia e arte de dizer (1930), de Silveira Bueno, O idioma nacional na escola secundária (1935), de Antenor Nascentes, e Português através de textos (1969), de Magda Soares, constatamos que no curso secundário brasileiro fomentavam-se especialmente práticas de ensino da leitura em voz alta. Essa leitura oralizada dispunha de atenção especial nas recomendações dessas obras didáticas, estabelecendo uma aproximação muito estreita com a tradição da arte retórica, com o objetivo de desenvolver habilidades específicas relativas ao domínio da eloquência, que representava um dos atributos essenciais na formação dos filhos da elite nacional, de início agrária e progressivamente urbanizada, nesse período de formação e consolidação do Estado brasileiro.
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