Globalização inacabada: o fracasso na abordagem do legado do colonialismo nos direitos humanos internacionais e na governança migratória

Autores

DOI:

https://doi.org/10.5007/2177-7055.2023.e96158

Palavras-chave:

ACNUR, Globalização, Decolonialismo, Colonialismo, Direito Internacional

Resumo

A era pós-Segunda Guerra Mundial do Direito Internacional foi prolífica na geração de processos intrincados e complexos de promoção dos direitos humanos, por meio da criação de normas específicas e agências especializadas, enquadrando a proteção dos indivíduos nos principais documentos de direitos. A maior parte destes instrumentos foram incorporados a nível doméstico dos Estados para proteger predominantemente os nacionais, os civis legais - uma perspectiva ainda muito ligada à dimensão territorial da Soberania do Estado. Dessa maneira, quando se trata de governança dos diferentes ramos do Direito Internacional dos Direitos Humanos, o Sistema Internacional ainda falha em não avançar no processo de descolonização como uma superação histórica do colonialismo, e não como apenas um processo puramente legal de emancipação das colônias, mas de quebrar o paradigma da dinâmica de poder dentro das próprias estruturas do Sistema, pois não foram criados mecanismos internacionais importantes para superar a vantagem colonial dentro das Organizações Internacionais - e isso se reflete na dinâmica institucional de agências especializadas e órgãos subsidiários da ONU, como o ACNUR, destinados a atender refugiados, sendo que alguns deles sequer foram projetados para durar mais do que seu mandato institucional original. Além disso, nas últimas décadas, com a expansão e facilitação do fluxo de informações, bens e serviços, tais facilidades não foram permitidas, em extensão, aos migrantes, e a figura do estrangeiro passa a ser tão mais interessante para o sistema econômico quando permanece indocumentado, ao contrário do cidadão nacional, protegido, e como a maioria dos migrantes econômicos e refugiados são do Sul Global, isso pode implicar em um processo de globalização inacabado, pois o próprio sistema se alimenta dessa lógica colonial, fazendo com que essa figura do migrante ilegal se alimente dela. Saskia Sassen e Anne Orford trarão luz sobre este assunto, sobre como a globalização econômica depende da atual divisão internacional do trabalho e da migração, explorando esses migrantes, porque esta privação de direitos que os torna indocumentados é a condição necessária para a sua exploração laboral.

Biografia do Autor

Estela Cristina Vieira de Siqueira, Universidade de São Paulo

Doutora em Direito Internacional pela FD-USP. Mestre em Direito, com ênfase em Constitucionalismo e Democracia, pela Faculdade de Direito do Sul de Minas. Especialista em Direito Internacional pelo Centro de Direito Internacional. Professora e Pesquisadora no Centro Universitário do Sul de Minas. Pesquisadora vinculada ao Grupo de Pesquisa CNPq "Direito Internacional Crítico". 

Cícero Krupp da Luz, Faculdade de Direito do Sul de Minas

Doutor em Relações Internacionais pela Universidade de São Paulo – USP. Professor do Mestrado em Constitucionalismo e Democracia da Faculdade de Direito do Sul de Minas – FDSM. Coordenador do Grupo de Pesquisa CNPq "Direito Internacional Crítico". Professor de Relações Internacionais da FECAP. E-mail: ciceroluz@gmail.com

Referências

ACHIUME, E. Tendayi. Migration as decolonization. Stan. L. Rev., v. 71, p. 1509, 2019.

ACHIUME, E. Tendayi. Reimagining international law for global migration: migration as decolonization?. American Journal of International Law, v. 111, p. 142-146, 2017.

ANGHIE, Antony. The evolution of international law: colonial and postcolonial realities. Third World Quarterly, v. 27, n. 5, p. 739-753, 2006.

BARNETT, Michael. Humanitarianism with a sovereign face: UNHCR in the global undertow. International Migration Review, v. 35, n. 1, p. 244-277, 2001.

BARNETT, Michael. Humanitarianism, Paternalism, and the UNHCR. Refugees in International relations, v. 105, p. 32, 2011.

BATIFFOL, H.; LAGARDE, P. Droit International Privé, tome 1, 8e edition. Paris, Librairie générale de Droit et de Jurisprudence, 1993.

BETTS, A., & LOESCHER, G. (Eds.). Refugees in International Relations. Oxford University Press, 2011.

CHETAIL, Vincent. Sovereignty and migration in the doctrine of the law of nations: An intellectual history of hospitality from Vitoria to Vattel. European Journal of International Law, v. 27, n. 4, p. 901-922, 2016.

FONKEM, Achankeng. The refugee and migrant crisis: human tragedies as an extension of colonialism. The Round Table, v. 109, n. 1, p. 52-70, 2020.

GLASMAN, Joël. Seeing like a refugee agency: a short history of UNHCR classifications in Central Africa (1961–2015). Journal of Refugee Studies, v. 30, n. 2, p. 337-362, 2017.

Hanhimäki, J. and Elie, J. B. ‘UNHCR and Decolonization in Africa: Expansion and Emancipation, 1950s to 1970s’. Dekolonisation: Prozesse und Verflechtungen 1945-1990. Archiv für Sozialgeschichte, no. 48, pp. 53-72, 2008.

IANNI, O. Globalização e diversidade. in: PATARRA, Neide (org). Migrações internacionais. Herança XX - Agenda XXI. Campinas: FNUAP; SP: Oficina Editorial, pp. 01-15, 1996.

ICJ. International Court of Justice. Statute of the International Court of Justice, 1945. Disponível em: <https://www.icj-cij.org/en/statute> Acesso em: 10 nov. 2022.

LOESCHER, G. The UNHCR and World Politics: A Perilous Path. UK: Oxford, Oxford University Press, 2001.

KOSER, Khalid. Why migration matters. Current History, v. 108, n. 717, p. 147-153, 2009.

KOSKENNIEMI, Martti. Empire and international law: the real Spanish contribution. University of Toronto Law Journal, v. 61, n. 1, p. 1-36, 2011.

KOSKENNIEMI, M. The gentle civilizer of nations: the rise and fall of international law - 1870–1960. Cambridge: Cambridge University Press, 2001.

MARTINE, George. A globalização inacabada: migrações internacionais e pobreza no século 21. São Paulo em perspectiva, v. 19, p. 3-22, 2005.

MIGNOLO, Walter D. Epistemic disobedience, independent thought and decolonial freedom. Theory, culture & society, v. 26, n. 7-8, p. 159-181, 2009.

ORFORD, Anne. Feminism, imperialism and the mission of international law. Nordic Journal of International Law, v. 71, n. 2, p. 275-296, 2002.

SASSEN, Saskia. Counter-geographies of Globalization. Feminist Post-Development Thought, p. 255-6, 2002.

SASSEN, Saskia. Strategic gendering as capability: One lens into the complexity of powerlessness. Colum. J. Gender & L., v. 19, p. 179, 2010.

SSENYONJO, Manisuli. The rise of the African Union opposition to the International Criminal Court’s investigations and prosecutions of African leaders. International Criminal Law Review, v. 13, n. 2, p. 385-428, 2013.

UNHCR. Convention and Protocol Relating to the Status of Refugee, 1951;1967. Disponível em: <https://www.unhcr.org/3b66c2aa10> Acesso em: 10 nov. 2022.

UN-OHRLLS. United Nations Office of the High Representative for the Least Developed Countries, Landlocked Developing Countries and the Small Island Developing States. Small Island Developing States. Disponível em: <http://unohrlls.org/about-sids/country-profiles/> Acesso em: 10 nov. 2022.

Downloads

Publicado

2023-11-22

Como Citar

VIEIRA DE SIQUEIRA, Estela Cristina; KRUPP DA LUZ, Cícero. Globalização inacabada: o fracasso na abordagem do legado do colonialismo nos direitos humanos internacionais e na governança migratória. Seqüência Estudos Jurídicos e Políticos, Florianópolis, v. 44, n. 94, p. 1–22, 2023. DOI: 10.5007/2177-7055.2023.e96158. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/sequencia/article/view/96158. Acesso em: 4 dez. 2024.