O comentário ensaístico como tradução: o exemplo de Mon cœur mis à nu, de Charles Baudelaire

Autores

DOI:

https://doi.org/10.5007/2175-7968.2018v38nespp135

Resumo

Ao traduzir o projeto póstumo Mon cœur mis à nu, de Charles Baudelaire, a partir dos seus muitos inacabamentos, propus um espaço de reescrita em que três traduções possíveis operam simultaneamente, cada qual colocando em cena uma dimensão específica dos seus inacabamentos: marcas matéricas do manuscrito; inexistência de uma ordenação definitiva; rede de historicidades das edições e traduções anteriores. Neste ensaio, ocupo-me especificamente do caso da (não) ordenação de Mon cœur mis à nu, procurando mostrar como a estratégia do comentário-ensaio como tradução me permitiu estabelecer uma relação com Mon cœur mis à nu que nem recorre a soluções apressadas (ordenação randômica digital, edição em folhas avulsas etc.) nem se limita a uma inviável restituição linear e cronológica dos manuscritos. Ao percorrer o texto ensaisticamente, num tipo específico de comentário que Antoine Berman chegou a esboçar teoricamente no seu também inacabado L’âge de la traduction, produz-se uma tradução possível desse texto, desenhada a partir de linhas de força que, atravessando a leitura e a escrita ensaística, talham, estilhaçam e rearranjam o original. Para diferenciar o comentário ensaístico de tradução da nota de tradutor, também é brevemente exposto o trabalho de Ana Cristina César sobre o conto Bliss, de Katherine Mansfield.

Biografia do Autor

Thiago Mattos de Oliveira, Universidade de São Paulo, São Paulo, São Paulo

É doutor em Letras pelo Programa de Pós-Graduação de Estudos Linguísticos, Literários e Tradutológicos em Francês (USP), sob orientação de Álvaro Faleiros. Em 2015, concluiu o Mestrado em tradução literária com dissertação sobre as (re)traduções brasileiras de "Mon coeur mis à nu, de Charles Baudelaire. Tem artigos publicados em revistas nacionais e internacionais. Foi professor de língua francesa no Programa de Letras Estrangeiras Modernas (UFF), programa de extensão vinculado à Fundação Euclides da Cunha de Apoio Institucional à UFF, e dos Cursos Extracurriculares de Francês (USP). Entre 2015 e 2017, fez parte do projeto de pesquisa ?Poética das margens no espaço literário franco-brasileiro?/?Poétique des marges dans l?espace littéraire franco-brésilien?, coordenado pelos professores Eliane Robert Moraes (USP) e Camille Dumoulié (Paris-Ouest). Publicou em 2012 o livro de poemas "Teu pai com uma pistola (Confraria do Vento), com o qual participou do Festival International de la Poésie de Trois Rivières, na província do Québec, Canadá. Publicou em 2013 o livro "Ler e fazer análise do discurso, em coautoria com Vanise Medeiros e Silmara Dela Silva. Em 2014, publicou o livro de poemas Casa devastada (Confraria do Vento). Em 2015, organizou e traduziu com Diego Grando a antologia Petite Rafale: nova poesia quebequense (OrganoGrama). Em 2017, publicou, em coautoria com Álvaro Faleiros, o livro A retradução de poetas franceses no Brasil: de Lamartine a Prévert (Copetti Editor). Em 2018, publica Solo: noturno a quatro vozes (Confraria do Vento). Tem experiência na área de Letras, com ênfase em tradução literária, literaturas de língua francesa, editoração e análise do discurso francesa.

Referências

BAUDELAIRE, Charles. Oeuvres complètes. Paris: Gallimard, 1983.

____________________. Correspondance II. Paris: Gallimard, 1973.

____________________. Mon cœur mis à nu. Édition diplomatique établie par Claude Pichois. Genève: Librairie Droz, 2001.

BENHAMOU, Françoise. Le livre à l’heure numérique. Paris: Seuil, 2014.

BERMAN, Antoine. L’âge de la traduction. Paris: PUV, 1999.

BLIN, Georges; CRÉPET, Jacques. Introduction: notes, éclaircissements et commentaires critiques. BAUDELAIRE, Charles. Journaux intimes: Fusées, Mon cœur mis à nu, Carnet. Paris: José Corti, 1949.

CESAR, Ana Cristina. O conto Bliss anotado. CESAR, Ana Cristina. Crítica e tradução. São Paulo: IMS e Editora Ática, 1999.

CRÉPET, Eugène. Journaux intimes: Fusées; Mon cœur mis à nu. BAUDELAIRE, Charles. Oeuvres posthumes. Paris: Maison Quantin, 1887, p. 67-70.

FALEIROS, Álvaro; MATTOS, Thiago. A retradução de poetas franceses no Brasil: de Lamartine a Prévert. São Paulo: Copetti Editor, 2017.

GALÍNDEZ, Verónica. Descontinuidade e leitura de manuscritos. Revista Manuscrítica, São Paulo, n. 16, USP, p. 10-24, 2009.

GIMÉNEZ, Diego. El nuevo Livro do desassossego de Jerónimo Pizarro. MatLit, [SL] v. 1, n. 2, p. 165-171, 2013.

GUYAUX, André. Préface. BAUDELAIRE, Charles. Fusées. Meu coração nu e cru. La Belgique Déshabillée. Paris: Gallimard, 2011 [1986].

KOMESU, Fabiana. Pensar em hipertexto. ARAÚJO, J. C.; BIASI-RODRIGUES, B. (orgs.) Interação na internet: novas formas de usar a linguagem. Rio de Janeiro: Lucerna, 2005, p. 87-108.

MATTOS, Thiago. (Re)traduções brasileiras de Meu coração nu e cru, de Charles Baudelaire. Dissertação de mestrado. Universidade de São Paulo, São Paulo, 2015.

PICHOIS, Claude. Notice. BAUDELAIRE, Charles. Oeuvres complètes. Paris: Gallimard, 1983.

_______________. Introduction. BAUDELAIRE, Charles. Mon cœur mis à nu. Édition diplomatique établie par Claude Pichois. Genève: Librairie Droz, 2001.

POE, Edgar A. Contes, essais, poèmes. Tradução de Jean-Marie Maguin e Claude Richard. Paris: Éd. Robert Laffont, coll. Bouquins, 1995.

POSSENTI, Sírio. Notas um pouco céticas sobre hipertexto e construção de sentido. Os limites do discurso: ensaios sobre discurso e sujeito. Curitiba: Criar, 2002, p. 205-225.

RIGEADE, Anne-Laure. Vers une pensée du texte traduit: une lecture de Pnine et Feu pâle et d’un extrait des deux traductions françaises de Ulysses. Palimpsestes, Paris, n. 20, 2007.

SARDIN, Pascale. De la note du traducteur comme commentaire: entre texte, paratexte et pretexte. Palimpsestes, Paris, n. 20, 2007.

Downloads

Publicado

12-12-2018

Como Citar

de Oliveira, T. M. (2018). O comentário ensaístico como tradução: o exemplo de Mon cœur mis à nu, de Charles Baudelaire. Cadernos De Tradução, 38(esp.), 135–156. https://doi.org/10.5007/2175-7968.2018v38nespp135