“Eles não sacrificam animais que nem aqui”: a ética das crianças e o enfrentamento ao racismo religioso

Autores

DOI:

https://doi.org/10.5007/1980-4512.2023.e90673

Palavras-chave:

Racismo Religioso, Ética, Experiência, Ubuntu, Crianças

Resumo

Este artigo tem como objetivo refletir sobre uma ética das experiências, identificando alguns elementos que operam na relação entre crianças que frequentam um terreiro de Batuque jeje-ijexá educação das entrelinhas, e também com as demais crianças da comunidade do entorno do referido terreiro. Para tanto, partimos das reflexões sobre racismo estrutural a partir de Almeida (2019), Passos (2015) e Munanga (2003), e sobre intolerância religiosa e racismo religioso de Nogueira (2020). Como metodologia, utilizamos a análise do discurso de Bakhtin (2010), apresentando três cenas e tecendo diálogos com as categorias ética e experiência de Benjamin (1994; 2002; 2013) e com a perspectiva da ética Ubuntu de Noguera (2012). Compreende-se que existem intersecções sociais e da ordem étnico-racial que engendram as relações analisadas neste artigo, e que nos dão pistas para compreender uma ética das experiências vivenciadas como condição de possibilidade para pensarmos a educação das entrelinhas por crianças.

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Biografia do Autor

Ana Paula Evaristo Russi, Universidade Regional de Blumenau - FURB / Universidade Estadua de Santa Catarina - UDESC

Mestrado em Educação pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC/2018). Licenciatura em Pedagogia pelo Centro Universitário Internacional (Uninter/2021). Licenciatura em Artes com Habilitação em Música pela Universidade Regional de Blumenau (Furb/2010). Professora no Centro de Educação à Distância (CEAD) da Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) desde 2022/1. Professora no Centro de Educação, Artes e Letras (CCEAL) da FURB desde 2020/1. Foi professora do CEE - Centro de Educação e Exatas da UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina (Campus Blumenau) em 2019/2. Prêmio Elisabete Anderle de Estímulo à Cultura - Eixo Artes populares, Categoria Culturas Negras e Afro-Brasileiras (2019). Prêmio Nacional Itaú Cultural - Rumos Educação, Cultura e Arte (2011-2013). Autora dos livros Cartografias Brincantes: Infâncias no Batuque jeje-ijexá (2020) e Música, Tecnologia e Educação (2021). Integrante do GENERA - Grupo Interdisciplinar de Pesquisas em Gênero, Raça e Poder da FURB. 

Josiele Bené Lahorgue, Universidade Regional de Blumenau - FURB

Doutora em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (2018) na área de concentração: Psicologia Social e Cultura e linha de pesquisa: Estética, processos de criação e política. Mestra em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina (2014) e graduada em Psicologia pela Universidade Regional de Blumenau - FURB (2006). Professora substituta da Universidade Regional de Blumenau. Ministra disciplinas de Psicologia da Educação e Psicologia da Aprendizagem e supervisiona estágios na área da Psicologia Social. Atuou como Professora do Curso de Psicologia da Faculdade CESUSC mantida pelo Complexo de Ensino Superior de Santa Catarina na qual coordenou o Grupo de Estudos e Pesquisa Gênero, Política e Interseccionalidade. Pesquisadora vinculada ao NUPRA - Núcleo de pesquisa em práticas sociais, estética e política. Articulou a Rede de Articulação Psicologia e Povos da Terra - Santa Catrina, de 2018 até 2021. Integrou a Diretoria da Associação Brasileira de Psicologia Política, na função de Secretária (gestão 2019/2020). Foi membra da Vice Regional da Associação Brasileira de Psicologia Social - ABRAPSO (gestão 2016-2017). Integra a coletiva Venta-Rua, com a qual atua em Santa Catarina, oferecendo formações e consultorias focadas nos eixos Educação, Sustentabilidade e Cultura. Possui experiência profissional em projetos voltados ao atendimento de crianças e adolescentes, direitos humanos, políticas públicas, deficiência, gênero e sexualidade. Em suas pesquisas tem entrelaçado discussões sobre os seguintes temas: políticas públicas, psicologia política, direitos humanos, gênero, sexualidade, feminismo, resistências, jovens.

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Publicado

2023-05-03

Edição

Seção

Dossiê - Infâncias, racismos e educação infantil