Racismo estrututal pedagógico na educação superior indígena: reflexões a partir de duas universidades
DOI :
https://doi.org/10.5007/2175-795X.2025.e100372Mots-clés :
Ensino superior, Povos indígenas, RacismoRésumé
O direito à educação aos povos indígenas foi construído enquanto política pública a partir de demandas de movimentos e intelectuais indígenas que garantiram a sua institucionalidade e demarcaram a importância da consolidação de projetos diferenciados na educação. Essa demanda, prevista no Plano Nacional de Educação (2014), estende-se ao acesso e à permanência de indígenas nas universidades brasileiras. As primeiras experiências surgiram antes da Lei de Cotas (Lei n° 12.711/2012), com foco em licenciaturas interculturais. Esse artigo utiliza a metodologia de triangulação de dados, combinando análise estatística descritiva dos microdados do Censo do Ensino Superior de 2024 (INEP) e análise qualitativa de duas universidades federais (UFG e UFOPA), com o objetivo de compreender os tensionamentos entre o modelo diferenciado de educação indígena e o modelo não-indígena da escolarização compulsória. Verificou-se que apenas 16,8% dos ingressantes indígenas optaram por instituições públicas, com concentração nas instituições do Sudeste (42,1%). A experiência institucional evidenciou entraves como burocracia, adaptação ao meio urbano, precariedade habitacional e estereótipos que afetam o sucesso no percurso acadêmico. Observou-se, ainda, a incorporação do discurso do fracasso escolar e da medicalização como justificativas para a manutenção do racismo estrutural pedagógico no ensino superior. Esse fenômeno merece especial atenção frente ao reposicionamento de discursos excludentes e à necessidade de fortalecer políticas educacionais inclusivas.
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