Pós-verdade para quem? Fatos produzidos por uma ciência racista
DOI:
https://doi.org/10.5007/2175-7941.2020v37n3p1440Resumen
Este ensaio busca trazer reflexões sobre a construção do sistema de verdades no qual se fundamenta a Ciência Moderna e Contemporânea e, mais especificamente, como o ensino de ciências, que sempre foi pautado numa lógica científica branca que nega o conhecimento produzido por corpos negros, posiciona-se nessa discussão negacionista do “outro”. Argumentamos que, no que concerne à própria estruturação da argumentação científica e de seu status quo, a Ciência Hegemônica — eurocêntrica e branca — é, por si só, um estado de pós-verdade para pessoas negras e suas epistemologias. As atuais preocupações da comunidade branca de ensino e divulgação de ciências, em relação ao negacionismo científico e à construção de narrativas que negam as produções da ciência branca, desconsideram que esse sempre foi o comportamento que tiveram com as epistemologias negras e os conhecimentos "estrangeiros". Ao longo do texto, trazemos exemplos de conhecimentos que são tidos como fatos objetivos e, no entanto, são fatos produzidos por uma comunidade racista e segue sendo reproduzida na educação em ciências, contribuindo com a perpetuação do racismo antinegro em nossa sociedade.
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