Entre o campo e a mina: valores e hibridações nas trajetórias de mineiros de carvão no sul do Brasil
DOI:
https://doi.org/10.5007/1984-9222.2015v7n14p75Resumo
Por meio da análise de narrativas de trabalhadores na mineração de carvão na Região do Baixo Jacuí, no Rio Grande do Sul, cujas trajetórias transitam entre o urbano e o rural, sugiro a existência de múltiplas concepções de honra neste contexto, relacionadas, sobretudo, ao caráter trágico da profissão, à militância sindical e aos jogos que caracterizam amplamente as relações dos mineiros com sua atividade. Neste universo - em que a mina de subsolo foi desativada em 2002 - emergem nos relatos, junto ao orgulho do “trabalho bem feito” e à exaltação das competências profissionais e da “coragem” para enfrentar patrões e chefias, manifestações que destacam a “esperteza”, a “ousadia” e a própria arte da malandragem, espécie de anti-honra que pode ser fonte de prestígio e de reconhecimento. As concepções que remetem às formas locais de construção da sua dignidade convivem com a representação em torno da “grande honra” da profissão, a imagem pública de heroísmo que carregam os trabalhadores das minas subterrâneas em diferentes lugares do mundo.
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