Editorial

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  • João Lupi

Resumo

O presente número da INTERthesis apresenta uma variedade peculiar de artigos, resenhas e traduções, que circulam entre a Sociologia, a Psicologia e a Antropologia, mas com freqüentes incidências – e esse é o ponto comum que mais desperta a atenção – em dois aspectos que surgem nas entrelinhas, quando não abertamente: a repercussão política de questões teóricas ou de ciência básica, e a revisão de metodologia e conceitos. O problema do escândalo da pobreza numa civilização globalizada, tecnicamente capaz de resolver todos os sofrimentos da humanidade, não tem origem apenas na vontade política ou na corrupção administrativa, mas segundo Diamantino Machado, também no modo como as ciências sociais têm definido a pobreza: desvios de conduta, parece dizer, daqueles que, supostamente podendo definir como eliminar a pobreza, erram na definição das ferramentas teóricas e constroem a reprodução do mal na prática. Ana Maria Fernandez faz a resenha do livro Conflitos Ambientais no Brasil de Henri Ascelrad. O autor destaca o desafio de encontrar instrumentos de análise para interpretar a complexidade dos processos sócio- ecológicos e políticos que colocam a ‘Natureza’ no interior dos conflitos sociais. Deficiência na conceituação de movimento, sempre mal explicado, é o que Giorgio Agamben, na tradução de Selvino Assmann, diz que tem levado à despolitização do povo; à aparente democracia do conceito corresponde um domínio do povo pelos partidos. É semelhante a crítica de Gilberto Ferreira da Silva e de Rejane Penna aos estudos sobre afro-descendentes no ensino Superior no Brasil: em vez de contribuir para a superação de situações injustas motivadas por preconceitos raciais as pesquisas ostentam uma metodologia pouco consistente sobretudo nas entrevistas orais, prejudicando assim os resultados e as ações positivas. O tema volta no artigo de Sílvia Maria de Araújo sobre ação coletiva, onde a autora destaca os equívocos na elaboração da categoria de análise: o fenômeno em si mesmo é evidente e quase onipresente, mas os conceitos envolvidos no seu estudo precisam ser melhor explicitados. Vera Viviane Schmidt ao estudar a sociedade organizada faz uma breve revisão histórica das políticas de saúde pública no Brasil desde 1980, confrontando-as com as diretrizes gerais da política do Estado Nacional. Para então para analisar o conceito de sociedade civil e suas concretizações práticas, para depois estudar as formas de intervenção política da sociedade organizada e passa aos movimentos sociais, sem fazer, como outros artigos, uma crítica de conceituação e metodologia, mas uma releitura das teorias pertinentes, aplicando toda essa análise às políticas de saúde e mostrando, inversamente, como práticas bem sucedidas podem interferir na discussão do paradigma. Neste conjunto de textos sobre relação entre metodologia, ciências e ação política intercalam-se outro conjunto que tem maior incidência em outras áreas básicas, iluminando-se desta forma os dois tipos de observações e de resultados de pesquisa. Steven Pinker debate uma questão que muito preocupa os antropólogos e que recentemente recebeu novas diretrizes de solução: a determinação do comportamento humano acolhe mais influências da natureza (da genética) ou da cultura (do artifício social)? E de novo nos deparamos com a “acusação”: metodologia e conceitos errados nas ciências básicas têm conseqüências desastrosas na ação prática – inclusive na educação de família. Rafael Raffaelli aprofunda a questão do agir humano ao analisar as alterações das concepções psicanalíticas e sua aproximação à fenomenologia: mais do que método, ou teoria do método, o autor entra na epistemologia e na revisão de teorias sobre o ser humano. Desta forma nossos textos foram passando da ação coletiva à individual e se aproximando da idéia de corpo e de vida, que Mirko Drazen Grmek aborda, por contraste, ao discutir a morte, na tradução de Selvino Assmann. É o conceito de morte que, envolvendo problemas de definição médica, conduz a procedimentos práticos críticos, como a determinação do estado de morte feita por consenso médico, mas sem definição do estado do paciente. Esta aporia obriga a discutir a vida e como é que a noção de morte tem implicações na decisão médica em casos extremos. O autor termina recorrendo à metafísica para esclarecer a reflexão do biólogo, e aqui nos damos conta de que, na discussão conceitual e metodológica dos textos desta revista, a Filosofia de algum modo sempre estava presente. João Lupi Editor

Publicado

25.04.2006

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Editorial