O pensamento decolonial antropofágico na educação em ciências
DOI:
https://doi.org/10.5007/2175-795X.2021.e66432Resumo
Defendemos que em Timor-Leste o fim da colonização portuguesa em 1975 e o fim da invasão indonésia em 1999, via plebiscito, não foram acompanhados pelo fim da colonialidade. Nesse contexto, buscando caminhos para pensar a educação em ciências, a presente pesquisa tem como objetivo analisar o pensamento decolonial antropofágico no ensino de Biologia em Timor-Leste. Para tanto, foram realizados círculos de leitura com 14 (quatorze) professores de Biologia do 10º, 11º e 12º ano do Ensino Secundário Geral do município de Díli. Esses círculos de leitura fundamentam-se em duas vertentes teóricas: a Análise de Discurso (francesa e brasileira) e o pensamento decolonial. Nessa direção, buscamos problematizar os manuais dos alunos de Biologia e construir horizontes decoloniais, mediante a articulação dessa disciplina com o contexto local. Os resultados sinalizam que os círculos de leitura se transformaram em um espaço intercultural crítico, configurando-se também como caminhos para a construção de um pensamento decolonial antropofágico, desde o sul global. Como exemplo teórico-prático, destacamos a leitura discursiva e decolonial a respeito da medicina ocidental e a tradicional timorense. Assim, em termos de considerações finais, reforçamos a importância de valorizar as experiências dos educadores e educandos timorenses e criar caminhos emancipatórios, sintonizados com a cultura e a realidade sócio-histórica desse país.
Palavras-chave: Timor-Leste, Currículo; Ensino; Biologia.
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